sábado, 19 de fevereiro de 2011

CRÔNICA | J. BICCA LARRÉ - Sobre as árvores

Diario de Santa Maria - 19/02/2011 N° 2743

j.larre@terra.com.br

Viceja agora na cidade uma polêmica sobre a revitalização da Avenida Rio Branco. Velha vereda que ligou a praça central à ferrovia, durante os anos poluentes dos trens movidos a carvão de pedra.

Mas tudo muda. Até o ar que respiramos muda. As pessoas mudam, a arquitetura modifica as paisagens. As árvores mudam, o paisagismo por vezes discute com a ecologia. Tudo muda. Desculpem a repetição do verbo.É para que fique marcado nos olhos, nos ouvidos e nas lembranças.

Cortaram algumas árvores antigas da avenida velha. É evidente que o não fizeram por malfazer às árvores. Então, os mais velhos e mais saudosistas entenderam que essas árvores não deviam ser cortadas. Ora, eu não entendo desse assunto, mas um resto de bom senso me recomenda que deve ter havido (três verbos de cambulhada!) uma opinião técnica e científica para o abate daquelas árvores. Algumas, de troncos ou raízes apodrecidas pelo tempo e pelas intempéries, ameaçavam tombar às ventanias. Outras, quem sabe, afloraram raízes e destruíram o passeio e o bulevar. É o que eu presumo.

Mas, como não sou agrônomo nem poeta, fui conversar com Bilac. E ele, sem discordar das podas feitas, limitou-se a me dizer de cor o seu soneto “Velhas Árvores”: “Olha estas velhas árvores, – mais belas/ Do que as árvores novas, mais amigas,/ Tanto mais belas quanto mais antigas,/ Vencedoras da idade e das procelas.../ O homem, a fera e o inseto à sombra delas/ Vivem livres de fomes e fadigas;/ E em seus galhos abrigam-se as cantigas/ E os amores das aves tagarelas.../ Não choremos, amigo, a mocidade!/ Envelheçamos rindo! envelheçamos/ Como as árvores fortes envelhecem:/ Na glória da alegria e da bondade,/ Agasalhando os pássaros nos ramos,/ Dando sombra e consolo aos que padecem!”.

– Mas, mestre Bilac – perguntei – os sábios também não morrem? Sócrates morreu pela cicuta; outros, pelo fio da espada da ignorância; outros mais pelo uso natural da vida... Tudo o que é vivo não está destinado a morrer? E as árvores, que envelhecem demais?

Então, Bilac baixou a fronte carregada e lembrou da terrível tuberculose que o levou à tumba. Balbuciou qualquer coisa que não consegui escutar. Depois, lembrando o mal que a doença lhe fizera, disse-me que por vezes a eutanásia – mas nunca o suicídio! – é um alívio. E concluiu que também as velhas árvores precisam morrer

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